quarta-feira, 29 de junho de 2011

O pecado da serpente

De repente, me deparo com uma daquelas serpentes. Sabe aquele mito raro entre os quais você acredita que nunca terá a oportunidade de encontrar. Foi interessante, foi intenso e assustador. Mas, o mais assustador foi sentir-me atado àquela cena. Uma serpente parou e me encarou. Em seu olhar fiquei preso, retido, trancado e preguiçoso. Por um momento me senti uma presa, daquelas indefesas, um rato silvestre pronto para ser devorado. Quando percebi, a serpente também estava parada, presa, fixa. Nos encaramos. Eu também sou serpente. Não com as mesmas cores e nem com a mesma peçonha, mas com o mesmo olhar, denso, sincero. Tragamo-nos. Foi um ato no mínimo surpreendente. Perder-se no olhar de uma serpente pode ser algo perigoso. Pode ser algo mortal, mas eu me sentia inteiramente compreendido, sem nenhuma intenção. E, por mais que parecesse uma estranha em meu ninho, eu, uma estranha no ninho dela, nos enroscamos pelos olhares. Duas serpentes. Diferentes mundos, diferentes olhos, diferentes botes, mas o mesmo olhar. Me senti preso aquele olhar que me reteve ali. Sibilei. Sibilou. Sibilou. Sibilou. Sibilei. Sibilei. E de repente, o mundo volta a rodar, muito depressa e intensamente rápido, para mim que estava preso a um momento mágico. Eu fui encarado por uma serpente talvez tão antiga quanto a tradição. Eu a encarei, como quem reconhece, com respeito, um ente próximo, uma companhia de fogueira, uma pessoa intensa.
Entre tantos caminhos possíveis. Eu fui para cima, depois para baixo, e não encarei mais o terror e o prazer daquela serpente, entretanto, fiquei fixo nos castanhos olhos daquela criatura que parece ter visto tantas, se não mais, eras que eu.

2 comentários:

  1. O olhar da serpente... A marca da serpente, fica no olhar.. sempre. hehe.

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  2. "...companhia de fogueira"

    achei lindo.

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